O texto a seguir contém spoilers.
Pois é, meus caros, depois de seis temporadas de inúmeros debates épicos no tribunal, How to Get Away With Murder (2014-2020) chegou ao fim. Não é surpresa pra ninguém que a série começou de forma inigualável e atraiu atenção de muita gente, ao passo que também não é surpresa pra ninguém que no meio do caminho, a série foi cometendo deslizes numerosos. Em vista disso, preciso constatar que a série conseguiu se reerguer de muitos momentos que soavam como incongruências após unir perfeitamente cada detalhe em aberto no que parece ter sido um dos melhores finais de séries da história.
É indubitável que a série conseguiria concluir o seu ciclo em, no máximo, cinco temporadas bem amarradas com menos saturação de elementos já não mais surpreendentes ou reviravoltantes. Em especial, as três últimas temporadas poderiam ter tido muitos momentos deletados em prol de resgatar a sensação eufórica dos percalços de crimes cometidos nas anteriores.
Apesar da qualidade ter caído no decorrer da trajetória, o momento final chegou ao ápice do escândalo e da comoção, entregando ao telespectador um desfecho além do esperado para uma série que havia decidido rumar um caminho tão morno até então. De forma conclusiva, vamos rever os pontos altos e baixos da série como um todo, os dialogando diretamente com o episódio final.
Annalise Keating viveu em liberdade
Premiada pelo Emmy Awards como Melhor Atriz em Série Dramática pelo papel, Viola Davis conseguiu não só se encaixar perfeitamente no papel, como por muitos momentos tediosos, se tornar responsável por segurar a trama com fulgor. Sua atuação foi profunda, imponente e acima de tudo, humana, transparecendo aspectos essenciais de vulnerabilidade que a tornam uma protagonista imperfeita, complicada e odiada por quase todos a sua volta.
Mesmo com as falhas à mostra, o público continuou amando e admirando a postura de Annalise a cada novo acontecimento da história. Os momentos em que ela buscou ajuda para os próprios problemas foram fundamentais para desenvolver as camadas da personagem. O modo como aprendeu a bater de frente com todos os seus defeitos remontam o quão forte ela é, ao ponto de chegar ao final, e mediante à sua própria defesa, saber descrever cada particularidade sua com convicção na frente de todo o tribunal em um dos discursos mais memoráveis da personagem.
Apesar de tanta dureza destilada a cada uma das pessoas com quem conviveu durante toda a série, Annalise nunca deixou com que ninguém fosse responsabilizado pela sujeira causada em conjunto, e no final das contas, acabou sendo julgada pela maioria dos embaraços causados por seus alunos. Ainda assim, o discurso mencionado acima a tornou inocente.
Quanto aos flashforwards que mostravam o velório da personagem, realmente se concretizaram, mas ele só aconteceu após uma vida próspera e feliz em que Annalise finalmente teve a paz que merecia. Ela morreu idosa e bem-resolvida.
Keating Five
Asher Millstone (Matt McGorry), Connor Walsh (Jack Falahee), Laurel Castillo (Karla Souza), Michaela Pratt (Aja Naomi King) e Wes Gibbins (Alfred Enoch) foram peças essenciais para toda a correnteza de assassinatos, planos e dores decorridos em toda a série. Os cinco começaram como os alunos selecionados de Annalise para trabalharem com ela, mas não demorou muito para começarem a se envolver mais intensamente na vida da professora a ponto de iniciarem a trama matando seu marido. O nível de curiosidade despertada pelo absurdo deste começo nos fazer querer entender como chegaram àquele ponto, e a cada aspecto de suas personalidades em tela, ficamos mais curiosos para vê-los interagindo entre si, uma vez que há uma competitividade anedótica em busca de um troféu simbólico – que futuramente, se tornaria a arma do (primeiro) crime.
Mas, como nem tudo são flores e os laços sempre se estreitam, os assassinatos cometidos pelos Keating 5 renderam momentos de muita proximidade e amizade com o decorrer dos problemas, e nem todos eles sobreviveram às adversidades dos contratempos plantados.
Wes Gibbins não estava vivo
No que parecia ser o período mais tenso da terceira temporada, Wes Gibbins foi dado como morto para a surpresa de todos os personagens e telespectadores, uma vez que entre todos os cinco, ele parecia ser o protagonista. Sua morte me fez entender que até o final da série, teríamos outras perdas dolorosas e imprevisíveis, e eu estava certo.
Apesar de ter iniciado a série soando irresponsável e menos focado nos assuntos da faculdade do que os demais, o personagem soava como o favorito da professora, e sim, ambos tinham um forte ligação – que remontou uma relação maternal – devido a fatos do passado que direta ou indiretamente, os ligavam.
Zeloso, determinado, sensível e esforçado, Wes de fato foi o assassino principal de Sam Keating (Tom Verica), defensor apaixonado e o protegido de Annalise. Sua morte foi um ponto alto na trama, e em vista da produtora da série, Shonda Rhimes, não deveríamos ficar surpresos com a morte de personagens queridos.
Não, Wes não estava vivo no velório de Annalise. Como dito anteriormente, era uma cena do futuro e ele estava representando Christopher, seu filho com Laurel.
Asher Millstone tentou trair o grupo e foi assassinado
Asher foi o único do grupo a não participar do assassinato de Sam Keating na primeira temporada, mas acabou por atropelar e matar Emily Sinclair (Sarah Burns) na segunda temporada após descobrir que ela estava envolvida no suicídio de seu pai.
Sendo mais impulsivo que o resto, Asher não conseguia manter a boca fechada em muitas situações. Ao ter traído o grupo após se tornar informante do FBI em prol de conseguir sair impune de todos os crimes mesmo que isso custasse colocar todos os outros na cadeia, ele foi assassinado por sua própria agente do FBI, a pedido dos Castillos, uma vez que ela trabalhava para eles.
Connor e Michaela foram inicialmente culpados pelo assassinato do garoto uma vez que pareciam os suspeitos mais prováveis, mas posteriormente, suas inocências foram comprovadas.
Michaela Pratt saiu impune de todos os crimes e se tornou juíza
Michaela sempre foi a mais competitiva e aparentemente egoísta de todos os cinco, e isso foi comprovado com o numeroso repertório de atitudes que cometeu durante as temporadas. Pensou sempre em si mesma acima de qualquer coisa em várias situações e isso faz que acabasse perdendo pessoas importantes para ela, como Asher e Tegan (Amirah Vann). A deportação de Simon (Behzad Dabu) e a traição a Asher foram pontos inesquecíveis deste aspecto da personagem.
Em oposição, a sua independência e a sua ambição tornaram-se inspiração durante muitos outros momentos, desenhando perfeitamente todas as metas da personagem e todos os respectivos obstáculos e resultados que ela teria com cada uma delas. Persistente e forte, Michaela encontrou uma saída para uma vida próspera depois de ter sua graduação assombrada pelos crimes cometidos ao lado de Annalise e dos demais. Depois de ser condenada provisoriamente pelo assassinato de Asher, tudo que ela queria era conseguir um acordo que a livrasse da responsabilidade de todos os outros problemas, e ela conseguiu.
No final das contas, ela se tonou juíza.
Laurel Castillo se safou da cadeia e a história de sua família foi concluída
Laurel iniciou sua jornada na série sendo a garota quieta e observadora do grupo, e mantinha, secretamente, um caso amoroso com Frank Delfino (Charlie Weber). Esperta, astuta e taxada de louca durante parte da história, Laurel evoluiu sua personalidade e o seu papel começou a ir além de uma simples aluna a partir do momento em que a sua família entrou para os principais arcos da história.
Tanto seu irmão e seu pai quanto sua mãe estavam por trás de muitos dos crimes e negócios que ocorriam ao redor de Annalise e de seus aliados – a incluir Wes -, e foi por esse ponto que em determinado momento o público começou a desconfiar que ela pudesse estar traindo o grupo para conseguir liberdade sozinha.
O sumiço de Laurel no final da quinta temporada deixou dúvidas acerca de sua índole, mas ela retornou no final da sexta temporada para depor sobre os crimes ocorridos e acabou negociando acordos que não lhe deram tempo algum de prisão, tudo em prol de dar uma vida melhor para seu filho.
Seu pai e seu irmão acabaram mortos no final da série: Xavier Castillo (Gerardo Celasco) foi morto por Nate após este descobrir que ele havia ordenado a agressão de seu pai, enquanto Jorge Castillo (Esai Morales) foi esfaqueado enquanto caminhava pela prisão.
Connor Walsh deixou a culpa o colocar na cadeia
Connor Walsh começou a série sendo um dos personagens com maior esperteza e dedicação quanto aos assuntos da faculdade. Disputava com Michaela o favoritismo de Annalise. Mostrou que mesmo com todos altos e baixos no decorrer da história, ele e Oliver (Conrad Ricamora) formaram o único casal que permaneceu unido no final de tudo – isso após os momentos tensos do pedido de divórcio por parte de Connor.
Com Michaela e Laurel livres da onda de crimes após assinarem acordos que as concederam liberdade, Oliver propôs a Connor que fizesse o mesmo, mas a culpa assombrosa por todos os crimes cometidos durante as temporadas o fizeram aceitar que deveria pagar por todos eles, e ele foi condenado a cinco anos de prisão após assinar outro acordo.
Em contrapartida, a cena do velório da Annalise mostrou que após muitos anos, ele e Oliver reataram e viveram juntos, com a consciência de Connor limpa e os problemas de todas as mortes que participou deixados para trás.
Frank e Bonnie foram mortos no tiroteio do tribunal, Nate saiu impune
Após Frank descobrir que a Governadora Birkhead (Laura Innes) estava por trás do assassinato de Hannah Keating (Marcia Gay Harden), ele não hesitou em partir para o tribunal em prol de abrir fogo contra a mulher. Enquanto Annalise discursava, Frank disparou contra a governadora, a matando.
Na tentativa de impedi-lo, Bonnie Winterbottom (Liza Weil) correu em sua direção, e ambos foram baleados e mortos por homens do FBI que atiraram em resposta. Após o pânico tomar proporções menores, Annalise correu para a escadaria e ao perceber que ambos haviam morrido no tiroteio, se debulhou em lágrimas em uma cena angustiante e dolorosa.
Frank e Bonnie, junto à Nate Lahey (Billy Brown), foram os maiores aliados de Annalise durante toda a série, participando ativamente dos crimes que ocorriam entre ela e os alunos. Lila Stangard (Megan West), Rebecca Sutter (Katie Findlay), Dominic (Nicholas Gonzalez) e Ronald Miller (John Hensley) foram alguns dos personagens que foram mortos nas mãos destes personagens.
Os três tiveram histórias importantes com temáticas fortes para a trama e impactaram a vida de Annalise.
Afinal, o que a série deixou de bom?
Com os destinos dos principais personagens pontuados, é importante analisar o macro e entender o repertório de temas levantados durante toda a série: um coletivo de personagens que contemplam diferentes minorias deve encarar a realidade doída do que é viver à sombra de crimes hediondos.
A série debateu diversidade de raças, etnias e sexualidade, abusos físicos e psicológicos, doenças mentais, HIV, vício em álcool, desigualdades sociais, entre outros assuntos importantes, tudo isso mediado pela luz das injustiças da lei perante as minorias. E a diversidade do elenco colaborou efetivamente para o êxito destas temáticas dentro da série.
A tensão da série em cada julgamento, os argumentos levantados e a realidade enraizada em todo o roteiro foram os pontos que tornaram How to Get Away With Murder uma trama sólida, com alguns momentos mirabolantes demais que nos entregaram justificativas pouco prováveis de ligações entre uma trama e outra, mas ainda assim, um drama que foi aberto há seis anos e fechado com maestria ao conseguir unir todas as suas ideias – por mais mirabolantes que às vezes parecessem.
Assim sendo, How to Get Away With Murder ficará para sempre na memória como uma série grandiosa que satisfatoriamente entregou tudo o que se comprometeu. Foi ousada, coerente e real.
Avaliação pessoal:
Primeira temporada: 9,3
Segunda temporada: 8,7
Terceira temporada: 7,9
Quarta temporada: 8,4
Quinta temporada: 7,2
Sexta temporada: 7,5
Avaliação final: 8,2.
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